Viver para trabalhar parece um exagero, mas só parece. Para a maior parte das pessoas, essa é a vida que se pode ter. O trabalho, obviamente, não é ruim em si mesmo; e se você ainda conseguir fazer o que gosta, encontrando satisfação pessoal e estímulo para sair de casa todos os dias, então você conseguiu um combo: dinheiro para pagar as contas e um sentido para ocupar a maior parte do seu tempo.
Construímos um mundo em que o trabalho possui um papel central. Lutamos pelo desenvolvimento científico e tecnológico, pela possibilidade de termos mais conforto e diversão, pelo direito de comprar morangos no supermercado fora da estação. Tudo isso é fantástico, e não sou contra esse tipo de conquista. No entanto, garantir tanto pra tanta gente não é simples. É preciso sacrificar alguma coisa se queremos produtos e serviços disponíveis o tempo todo. E quando isso nos falta, a sensação de descontentamento é gigantesca.
Um exemplo: hoje, segunda-feira de carnaval, fui com minha família almoçar em um restaurante que gostamos, e ele estava fechado. Mas como assim estava fechado? Eu tinha dinheiro para pagar almoço, queria almoçar lá, e agora ia ter que procurar outro lugar para encher a barriga? Tá vendo só como nos tornamos egocêntricos e egoístas? O mundo gira ao nosso redor porque sentimos sempre que nos doamos demais e devemos ser recompensados por isso. Trabalhamos e nos sentimos injustiçados, mas continuamos defendo o argumento de que o trabalho nos dá dignidade. Um outro caminho? Aceitar viver com menos. Mas quem consegue?
Ilustração de Simón Prades