Ensinar é difícil

Como professor de Filosofia eu me interesso sempre menos pelo aspecto filosófico (no sentido técnico do termo) e mais pela característica pedagógica do que faço. Já conheci vários outros professores de Filosofia que dedicavam grande parte do tempo que tinham para estudar autores, ideias, conceitos e para se especializarem em algum ponto da história da filosofia; mas não gostavam de discutir educação, muito menos o que fazer em sala de aula.

Como professor, a sala de aula é a minha maior preocupação. Me angustia como vou dar aula e o quê eu vou ensinar.

Mas você não é professor de Filosofia? Não é meio óbvio o que vai ensinar?

Mais ou menos.

Eu sei que vou ensinar Filosofia. Mas entrar em sala e despejar Platão, Descartes e Schopenhauer em cima dos estudantes, como se a realidade do cotidiano deles pudesse ser facilmente compreendida por um grego, um francês e um alemão, que viveram em outras épocas e tiveram referências de vida social totalmente distantes das nossas, não me parece o melhor caminho para fazer a filosofia cumprir o seu papel em sala de aula.

A filosofia, da forma como eu a vejo, ajuda o estudante que não quer ser profissional da filosofia lhe mostrando como fazer perguntas melhores, como se confrontar com questões fundamentais e como entender e desenvolver argumentos. Mas isso não vai ocorrer simplesmente porque os filósofos serão apresentados em sala, e sim no processo de internalização das ideias, conceitos e métodos por cada estudante. Por isso, no final, penso, como Martha Nussbaum, que acreditava na educação como uma forma de relacionamento com nossas habilidades emocionais e empáticas:

“A educação deve nutrir a capacidade de simpatia para com os outros, especialmente as pessoas cujas vidas são muito diferentes das nossas. A educação deve cultivar a imaginação emocional, de forma que possamos imaginar o que é sentir-se maltratado, oprimido, humilhado, e assim por diante, por alguém cuja vida é muito diferente da nossa própria.” (Nussbaum, M. Not for Profit: Why Democracy Needs the Humanities. Princeton: Princeton University Press, 2010)

Platão, Descartes e Schopenhauer escreveram sobre temas que interessam a todos nós; e, tiveram, a despeito da nossa falta de imaginação, vidas normais, pontuadas por eventos cotidianos, assim como qualquer outro ser humano. Não eram deuses desvendando segredos (ainda que tenham deixado essa impressão). Demonstrar a humanidade deles e de suas ideias e conectar isso com a humanidade das pessoas em sala de aula, essa é a minha tarefa como professor de filosofia. É mais sobre empatia e conexão humana, e menos sobre técnica de leitura ou identificação de conceitos. E por isso ser professor é tão desafiador.

Marcos Ramon

Professor no Instituto Federal de Brasília, pesquisando ensino, estética e cibercultura. Lattes | ORCID | Arquivo

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