Por que a Nintendo ainda é a empresa mais relevante da Indústria de Videogames?
O ano era 1983. A indústria dos videogames, que parecia promissora desde o surgimento da segunda geração de consoles no final da década de 1970, entrava agora em colapso. A grande quantidade de jogos disponíveis no mercado (milhares de jogos, produzidos por centenas de empresas), a pouca diversidade de propostas e a ausência de concorrentes de peso incentivando o desenvolvimento de novas ideias, fizeram com que muitos apontassem o fim do mundo dos jogos para os consoles.
Um dos últimos grandes jogos anunciados para o Atari, o ícone maior dessa geração de consoles, foi o jogo "baseado" no filme E.T., de Steven Spielberg. O jogo foi lançado em 1983 e é geralmente citado como um dos responsáveis pelo Crash dos videogames de 1983-1984.
E.T. para Atari, lançado em 1983.
Com esse jogo ficou provado que aquele sistema com tantas limitações não tinha muito mais para oferecer do que aquilo que já havia sido feito com Pitfall!, River Raid e Space Invaders, por exemplo. O Atari sempre foi, desde o princípio, um console que tinha como proposta levar o ambiente dos jogos de Arcade para dentro de casa (Space Invaders, citado anteriormente, é um exemplo clássico disso). Mas a experiência nem era melhor e nem justificava o investimento, já que o que se tinha era, basicamente, um sistema muito mais limitado do que o dos Arcades e excessivamente repetitivo.
Quando a Nintendo surgiu (não a empresa, mas o console, o Famicom, lançado no Japão em 1983), a proposta parecia ser a mesma: levar a experiência do Arcade para a tela da televisão. Vale lembrar que a própria Nintendo já tinha emplacado um grande sucesso nos Arcades: Donkey Kong.
Donkey Kong, Arcade, 1981.
Mas as possibilidades de um console um pouco mais poderoso em termos gráficos, com um nível de jogabilidade mais apurado e com ótimas ideias por parte dos desenvolvedores, mostraram que havia ainda um caminho louvável para ser explorado no mundo dos jogos caseiros. The Legend of Zelda, Super Mario, Kid Icarus e Metroid foram alguns dos primeiros jogos que chegaram para mostrar do que a Nintendo era capaz.
Não era apenas uma questão de melhoria gráfica ou de maior poder de processamento de dados. A principal diferença entre um Atari e um Nintendinho (foi assim que ficou conhecido no Brasil o Famicom) era a possibilidade de você viver experiências com as histórias que estavam sendo contadas, se envolvendo com os personagens e a ambientação dos jogos, algo muito maior do que a proposta quase casual dos jogos de Arcade em que o principal objetivo era, necessariamente, bater o recorde de pontos. Os videogames chegaram à época das narrativas.
The Legend of Zelda, Nintendo, 1986.
Algumas dessas narrativas eram, ainda, estupidamente simplistas, como no caso de Super Mario, em que só precisávamos saber que existia uma princesa para ser salva. Daí pra frente era só sair pulando feito loucos. Nesses casos a jogabilidade superava a limitação da história e fazia a experiência, ainda que repetitiva, valer a pena. No caso de jogos como Zelda ou Metroid, no entanto, esses aspectos de ambientação e narrativa já eram bem mais desenvolvidos.
A Nintendo salvou a indústria dos games, mostrando que havia espaço para uma grande diversidade de jogos (focados na história ou simplesmente na pontuação), atraindo novos consumidores, criando franquias de jogos que existem até hoje e estimulando a concorrência. Depois do Nintendinho, e, certamente, só porque existiu o Nintendinho, nós pudemos conhecer inúmeros consoles que foram criados nos anos seguintes: Master System, Mega Drive, Super Nintendo, Neo Geo, Sega CD, Nintendo 64, Playstation etc.
Atualmente, contudo, a situação é bem adversa para a Nintendo. Seu console anterior, o Nintendo Wii, apesar de ter sido um sucesso de vendas, recebeu muitas críticas e perdeu muitos de seus prováveis consumidores para os concorrentes: o Xbox 360 e o Playstation 3. O Wii U, o atual console da empresa, lançado em 2012, ainda não deslanchou e não parece receber atenção quase nenhuma da crítica especializada, das empresas desenvolvedoras de games e nem mesmo de boa parte dos gamers, que apenas aguardam o lançamento do PS4 e do Xbox One.
Mas o que justifica esse tipo de rejeição?
Pra tentar explicar isso vale lembrar algumas das acusações mais comuns contra o atual direcionamento da Nintendo:
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Os seus consoles e jogos estão muito mais voltados para o público casual, aqueles que apenas eventualmente irão usar o videogame;
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A Nintendo parece desconsiderar a importância do desenvolvimento técnico que proporciona hoje maior capacidade de processamento e gráficos cada vez mais realistas para os jogos, algo que se pode notar de maneira extrema na comparação entre os jogos do Wii e do PS3, por exemplo;
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A Nintendo insiste na repetição de fórmulas prontas com as suas franquias de sucesso já consolidadas: Mario, Zelda, Metroid etc.;
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Os jogos da Nintendo (e o próprio console) possuem uma apresentação infantilizada, afastando o público adulto.
Mas apesar de todas as críticas eu ainda acho que a Nintendo é a empresa mais interessante e relevante dessa atual geração. E por quê?
Super Smash Bros, para Wii U, previsto para 2014.
O mercado de games atual se tornou algo muito maior do que o próprio sentido dos videogames como forma de entretenimento. Esse mercado é feito basicamente para adultos, pessoas que, da mesma maneira que eu, começaram sua vida de gamers assoprando cartuchos, depois de terminar o dever de casa. Essas crianças que jogavam Sonic, Super Mario, Contra e Alex Kidd, cresceram e se tornaram mais exigentes. Passaram a querer jogos mais violentos, mais imersivos, mais realistas. Deixaram de se preocupar com a diversão proporcionada pelo videogame e passaram a discutir os chips gráficos, os recursos extras de conexão com a Internet e serviços de televisão, a memória e os processadores. Bem, faz sentido. São adultos que jogam esses videogames e não crianças.
E é nesse ponto que entendo o valor da Nintendo. Se depender do Xbox One e do PS4 a indústria do videogames vai envelhecer e morrer com as mesmas pessoas que começaram jogando Super Nintendo ou Mega Drive. Essas empresas estão transformando o ato de comprar um videogame em uma escolha de um eletrodoméstico, o que nos faz entender a lógica do quanto mais funções melhor.
Como será formada a próxima geração de pessoas interessadas em videogames? Jogando PS4 e XBOX One? Eu duvido. A próxima geração de jogadores crescerão jogando em um Nintendo Wii U ou em um Nintendo 3DS! Naturalmente, isso não significa que adultos não podem se divertir jogando jogos da Nintendo. Tomando o Wii como exemplo: é preciso muito esforço para que um adulto não se divirta jogando Mario Kart, Kirby ou Donkey Kong Country Returns. Mas muito esforço mesmo! No entanto, muitas pessoas não vão querer nem se arriscar. Afinal de contas, um jogo jogado por um adulto não pode ter esses gráficos tão infantilizados. Parece até da época em que a gente ainda era criança…
O videogame é um brinquedo e a Nintendo sabe disso. E ela faz os melhores brinquedos, os mais divertidos, os mais significativos. A Microsoft quer fazer uma caixa-preta-faz-tudo pra enfeitar a sua sala. Mas o que a indústria de jogos precisa é de uma coisa bem mais simples: jogos. E você conhece alguém melhor do que a Nintendo para fazer isso?